quarta-feira, 11 de agosto de 2010

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Ela havia me dito qualquer coisa sobre uma cidade circular ao sul onde nunca se sabe se está chegando ou partindo. Eu pensava que era ao norte que essas coisas aconteciam. Mas o norte já não me atrai. Estou livre. Eu sei: jamais se deve confundir alguém com a sua descrição. Eu fiz essa confusão. Paguei o preço. Acabei por me carregar para dentro da caixa. Involuntário; ainda que por vontade própria. Desde então, sempre que acordo penso que ainda estou a dormir. E enquanto durmo desperto para um lugar onde vivem os sonhos. E é lá que existo agora; mesmo o agora lá nem existindo. Há um tempo que não pode ser contado; por conta de se correr o risco de estar errado. E estar errado é o próprio risco; mas não é certo. É dúvida. E há o frio. Uma nuvem que sai da boca. Bem lá do céu. E, antes de tudo aqui, havia uma página em branco. Agora uns pedaços de vidas; não; vividas. A quantidade de coisas que se poderia tirar de um encontro nem se compara ao manancial obtido pelo seu oposto. Toda uma obra. Toda uma vida. Sinto que serei grato ao eterno. Produzirei para todo o sempre aqui de dentro; sobre o mesmo assunto e suas variações. E eu agradeço a ela pela ligação norte sul, por ser circular, por ser para sempre mesmo sem ter planejado. Por ser minha ida, minha volta e meu retorno. Meu desespero, meu dia inteiro, minha alavanca. Agradeço por me fazer pensar que seria minha, e por me permitir recheá-la de sua ausência. Agradeço a mim por me permitir criá-la; e a ela por me instruir matá-la.

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